OPINIÃO: NÃO SE MENTE À PRÓPRIA MENTE

Junho é o Mês de Conscientização para a Saúde Mental Masculina, embora tal fato seja desconhecido por muitos. A consequência para muitos que resolvem não cuidar dela acaba sendo o suicídio, e é sobre isso (e como evitá-lo) que falará esta Coluna de Opinião (Foto de Gabriela Palai para Pexels) 


AVISO AOS LEITORES: ao contrário de nossas reportagens, a Coluna de Opinião traz, como o próprio nome já diz, a opinião de quem a escreve sobre fatos concretizados, não representando necessariamente um posicionamento oficial do Podcast Cafezinho com William Lourenço, enquanto veículo de imprensa (emitido somente por meio de nossos Comunicados Oficiais e Editoriais).

Por João Gabriel Silva


Há dores que não gritam nem se mostram na face. Elas sussurram entre as pausas da rotina, esgueiram-se no silêncio dos cômodos vazios, escondem-se sob sorrisos automáticos, sob máscaras sociais. Em muitos casos, o suicídio não aparece como uma vontade de morrer, mas como uma tentativa de pôr fim a um sofrimento que se tornou insuportável, onde viver não representa mais uma alegria, mas sim um tormento sem fim. 
Para compreendê-lo, precisamos olhar para além da superfície e irmos mais além da ideia de frescura, falta de alguma divindade ou outra coisa qualquer. Na psicanálise, o suicídio pode ser entendido como um conflito interno extremo, onde o sujeito volta contra si forças destrutivas que, muitas vezes, estavam inicialmente voltadas para o mundo externo. Freud nos fala do “instinto de morte”: uma pulsão silenciosa, regressiva e que habita em todos nós. 
Quando o ego sucumbe à culpa, à perda ou à frustração narcísica, essa pulsão pode tomar a frente. O sujeito, nesse caso, já não encontra mais sentido nem na falta nem no desejo. Ele não quer exatamente morrer, mas ele não vê como continuar existindo. Vive-se uma prisão sem perspectiva de escape a não ser sucumbir à morte. A filosofia, por sua vez, nos obriga a confrontar a pergunta incômoda de Albert Camus: “O suicídio é o único problema filosófico realmente sério.” 
Em sua obra O Mito de Sísifo, Camus argumenta que a consciência da absurdidade da vida sua falta de sentido intrínseco pode levar o homem à beira da desistência. Mas ele propõe a “revolta”, a escolha de viver mesmo diante do absurdo, criando sentido onde não há. Para Camus, viver é um ato de desafio. A vida não precisa de justificativa além da própria experiência de estar vivo, contudo, para algumas pessoas em seu limite isso não basta. Do ponto de vista psicológico, o suicídio frequentemente se inscreve como o ponto culminante de uma série de fatores: depressão profunda, desesperança, traumas não elaborados, isolamento social, falta de suporte afetivo, falta de esperança em relação ao futuro, solidão. 
A ciência busca entender os padrões, identificar os sinais, intervir antes do colapso. No entanto, cada caso é singular. Números não exprimem o drama de uma mente em desintegração, de uma subjetividade em ruínas, de alguém que está à beira do abismo contemplando seu fundo. 
Talvez o maior desafio seja escutar. Escutar de verdade. Não com o desejo de resolver imediatamente, mas com a disposição de estar presente no desamparo do outro. Porque, no fundo, o suicídio é também um grito. Um grito abafado por uma sociedade que idolatra a performance e despreza a vulnerabilidade, um grito de desespero pelo abandono, a dor da solidão que torna viver insuportável. Vivemos tempos em que a tristeza virou tabu, e o sofrimento precisa ser medicado, disfarçado, escondido. 
Falar de suicídio não é glorificá-lo, mas desmistificá-lo. É abrir espaço para que possamos pensar e sentir juntos. É um gesto de cuidado com o outro e consigo mesmo, contudo, vivemos uma era narcísica em que o outro é usado como objeto para se conseguir algo e depois ser descartado. As pessoas não estão interessadas em ouvir o outro: apenas falar de si mesmas. Em última instância, esta reflexão é um convite à compaixão. A compaixão ativa, que não apenas sente, mas se dispõe a estar ao lado.
Porque, muitas vezes, o que salva uma vida é a simples e imensa presença de alguém disposto a escutar.
Deixe de lado seu ego, escute os sussurros silenciosos daqueles que sofrem e que convivem com você, pare, olhe e ouça. Os gritos podem ser silenciosos, mas estão mais perto de você do que imagina.
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