Foi realizada na tarde desta sexta-feira uma audiência virtual na Vara Única da Comarca de Buíque, em Pernambuco, referente a uma ação civil de improbidade administrativa aberta em 2013 pelo Ministério Público de Pernambuco contra o atual prefeito do município, Arquimedes Valença (MDB) em três frentes de acusação. O Podcast Cafezinho com William Lourenço obteve acesso ao vídeo da audiência, por meio do site de Consulta Processual Unificada do Tribunal de Justiça de Pernambuco.
A primeira acusação é de que, enquanto gestor municipal no ano de 2001, Arquimedes teria deixado de usar o percentual mínimo exigido por lei do antigo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef) para o pagamento dos professores da rede municipal de ensino, causando prejuízos ao erário e à qualidade do sistema educacional do município. O Fundef foi extinto em 2006 e substituído pelo Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação). O percentual mínimo exigido por lei para o pagamento dos professores era de 60%, enquanto que o município de Buíque só investiu 42% para essa finalidade.
A segunda acusação é de que a Prefeitura repassou à Câmara de Vereadores, em 2001, mais dinheiro do que o limite imposto por lei do chamado duodécimo (repasse para despesas aprovadas no Orçamento). De acordo com o TCE, o valor repassado pela Prefeitura aos vereadores foi de R$ 421.199,16 (quatrocentos e vinte e um mil, cento e noventa e nove reais e dezesseis centavos), enquanto o limite era de R$ 398.308,40 (trezentos e noventa e oito mil, trezentos e oito reais e quarenta centavos).
A administração municipal também foi acusada de não fornecer alguns relatórios de demonstrativos de dívidas aos órgãos de controle como o próprio TCE, o que teria prejudicado o cálculo do limite para a dívida consolidada do período.
A aprovação das contas foi realizada com ressalvas pelos desembargadores do TCE em 2003, recomendando o prefeito que efetuasse o desconto no duodécimo repassado irregularmente à Câmara (uma diferença de mais de 20 mil reais) e recompor à conta do então Fundef o percentual que havia deixado de ser aplicado com a remuneração dos profissionais do magistério naquele ano (o valor total em reais não foi citado em nenhum momento da audiência).
Voltando à audiência, houve a desistência de uma testemunha e a coleta do depoimento de outra: Nadja Teresa Souza Cavalcante foi secretária de Finanças de Buíque em 2001, e respondeu às perguntas do advogado de defesa do prefeito e do representante do Ministério Público. Na maior parte de seu depoimento, a ex-secretária deu algumas informações desencontradas.
Segundo Nadja, em seu depoimento, os tais 60% do Fundef para a remuneração dos professores, de fato, não foram aplicados, mas tentou explicar que boa parte desses profissionais não eram efetivos, que o pagamento desses valores foi feito aos profissionais "em sala de aula" e que o TCE não considerou esse tipo de pagamento como válido para se enquadrar nesse limite mínimo do fundo. Ela disse também que não houve apropriação indébita do valor que deixou de ser repassado do Fundef.
Sobre o duodécimo, Nadja explicou que, à época, o cálculo do repasse à Câmara era feito sempre em cima da receita do município. Que havia um contador que fazia este cálculo, e que, recebendo os cálculos dele, somente liberava os pagamentos, descobrindo essa irregularidade apenas por meio do parecer do TCE. Ela reitera que o prefeito não sabia de nada, e que acredita em um erro de cálculo por parte do pessoal da contabilidade, limitando-se a dizer que somente recebia os cálculos e liberava os pagamentos.
Sobre os relatórios que deixaram de ser repassados aos órgãos de controle, Nadja novamente colocou a culpa no então contador, sem citar qualquer nome. Repetiu que o prefeito não teve nenhum envolvimento ou conhecimento sobre os dados da prestação de contas, e que ele não se beneficiou nem beneficiou ninguém ao deixar de pagar os 60% do fundo. Que, por mais que a pasta das Finanças ficasse responsável pela prestação de contas, o acompanhamento sobre o uso do dinheiro do Fundef era de responsabilidade da Secretaria de Educação. E que nem ela, nem o prefeito, revisavam a prestação de contas depois de recebida da Contabilidade: do jeito que lhes era entregue, era enviado ao Tribunal.
A defesa de Arquimedes Valença pediu à Juiza Substituta Ingrid Miranda Leite que, baseado nas alterações da Lei de Improbidade Administrativa sancionadas neste ano pelo presidente Jair Bolsonaro, fosse considerada a prescrição intercorrente de todos os crimes imputados a ele, levando em conta que os atos teriam ocorrido há 20 anos e que a ação já teria sido aberta há oito anos. Tanto a defesa quanto o Ministério Público irão agora apresentar as alegações finais num prazo máximo de dez dias, contados a partir da data desta audiência. A tendência é que o MP concorde e siga com a tese da prescrição nesse caso.
Além desta ação civil, Arquimedes Valença ainda responde a outras sete ações civis de Improbidade Administrativa (um deles já está nas mãos da Procuradoria Regional Federal da 5ª Região), um Procedimento Investigatório Criminal (já aceito pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco), duas ações civis comuns e um Mandado de Injunção. Nosso site já publicou diversas matérias falando sobre esses processos (leia também as matérias abaixo).
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O Podcast Cafezinho com William Lourenço entrou em contato com a Promotoria de Justiça de Buíque para obter alguma resposta a respeito desta e das outras ações abertas pelo Ministério Público de Pernambuco contra o atual prefeito Arquimedes Valença. Por e-mail, nos foi repassado o contato da Assessoria Ministerial de Comunicação Social do MPPE e nos foi informado que essas informações deveriam ser solicitadas por esse canal. Enviamos a solicitação de resposta no sábado à tarde e, até o fechamento desta matéria, não havíamos recebido nenhuma manifestação por parte da assessoria de imprensa do Ministério Público de Pernambuco. Assim que recebermos, ela será devidamente publicada em nosso site e demais perfis oficiais.
O mesmo vale às demais partes citadas nesta reportagem: nosso e-mail para recebimento das respostas está na aba Contato do nosso site.